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REPORTAGEM

DEPRESSÃO

Reportagem especial sobre depressão

Depressão é uma doença incapacitante e afeta milhões de pessoas em todo o mundo. Ela ainda é envolta de preconceitos e estigmas, o que faz alguns demorarem a procurar ajuda. Ela causa efeitos tanto na mente como no corpo de quem a enfrenta. Mas existem tratamentos, tanto convencionais como alternativos ou complementares. Essa reportagem abordará a depressão em cinco temáticas.​

“Quando é um transtorno físico não tem problema, mas a depressão é um transtorno mental, aí tem um preconceito”

 

Por Sabrina Teixeira

Segundo relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS), a depressão atinge 322 milhões de pessoas em todo mundo, o que representa cerca de 4,4% da população mundial. Ainda de acordo com a pesquisa, que traz dados referentes a 2015, a depressão é a doença não-fatal que mais incapacita pessoas em todo o mundo. No Brasil a doença atinge 5,8% da população, o que representa 11 milhões e 500 mil pessoas, conforme os dados da OMS. Com essa quantidade de pessoas, o Brasil é o país da América Latina com o maior número de casos da doença e com a quarta maior incidência no mundo.

Das cinco regiões brasileiras, segundo a última Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) publicado em 2013, a região Sul é a que registrou o maior número de casos de depressão por habitante, com 12,6% da população. Em seguida vem a região Sudeste com 8,4% da população da região, em terceiro está o Centro-Oeste com 7,2% dos habitantes, em quarto a região Nordeste com 5,0% da população e por último a região Norte com 3,1% de seus habitantes. No Estado do Ceará, a depressão atinge 4,4% da população, cerca de 380 mil cearenses, ainda de acordo com a PNS de 2013.

A depressão é uma doença classificada em três níveis de intensidade: leve, moderada e grave. Dependendo da duração e da intensidade, a doença pode se tornar uma séria condição de saúde, necessitando de acompanhamento psiquiátrico e/ou terapêutico.

 

Na sociedade em geral pouco se fala sobre depressão, produtos culturais como filmes, novelas e seriados raramente retratam a doença, e quando o fazem, geralmente, reproduzem a doença de maneira superficial. Popularmente, a palavra depressão é utilizada como sinônimo de tristeza ou melancolia, mas a relevância da doença é ignorada. Para o médico psiquiatra Fábio Gomes, a sociedade tem certa resistência em lidar com as doenças de ordem mental, “quando é um transtorno físico como diabetes e hipertensão, não tem problema. Mas depressão é um transtorno mental, e aí tem um preconceito contra transtorno mental”.

O estigma que existe contra doenças mentais, como a depressão, leva as pessoas que sofrem com a doença a se sentirem relutantes em expressar suas aflições, dificultando a busca por ajuda especializada. De acordo com a assessora técnica da Célula de Atenção à Saúde Mental do município de Fortaleza, Andrea Maluf, “a melhor forma de tratamento é as relações de amizade, a rede social de apoio, porque [os depressivos] são pessoas que precisam desses vínculos para se sentir menos sozinhas, menos frágeis, menos isoladas”.

Mas a falta de informação faz com que até mesmo a família de pessoas depressivas tenham preconceito contra a doença. A estudante Ana Júlia relata que inicialmente a mãe se recusou a aceitar a doença da jovem, “até ir no psicólogo era uma coisa meio absurda. Minha mãe sempre foi uma pessoa que se importava muito com o que outras pessoas pensavam, ela pensava - ah, mas se tu for no psicólogo, tomar remédio, o que teu pai vai pensar de mim? Vai pensar que eu não tô te criando bem - ela sempre levava para o lado pessoal”.

Quando a depressão se apresenta na forma de apatia e faz com que o doente deixe de realizar as tarefas do cotidiano, por vezes, há uma incompreensão por parte daqueles que convivem com esta pessoa. Familiares e amigos não sabem lidar com o abatimento do depressivo, remetendo a incapacidade de realizar as atividades do dia a dia a uma preguiça por parte do depressivo. Andrea Maluf, conta que “por conta da estigmatização que existe, naquele momento em que a pessoas tá acometida por alguma coisa ela fica como se tivesse um defeito para nossa sociedade, [sociedade] que precisa produzir, que precisa ganhar dinheiro, que precisa consumir”.

Mesmo o tratamento contra a depressão é visto como tabu. Visitar um psicólogo e/ou um psiquiatra ainda é considerado por muitos como procedimento feito apenas por gente “doida”. A medicação também é vista com preconceito. Toda medicação utilizada para tratamento de doenças do sistema nervoso recebe em sua embalagem uma tarja preta para indicar o risco de dependência. Contudo, a partir da associação desses remédios com as doenças mentais, a expressão “remédio tarja preta” comumente é relacionada a contextos negativos.

 

Segundo a OMS, menos de 10% das pessoas que sofrem com depressão recebem tratamento. Os obstáculos enfrentados até receber ajuda profissional é prejudicial para os depressivos. A demora em receber suporte terapêutico e/ou psiquiátrico pode agravar o quadro do paciente.

No período de 2005 a 2015 o número de casos registrados de depressão teve um crescimento de 18,4%. O crescente número, comprova a recorrência da doença e alerta para a necessidade de superar os estigmas que cercam a depressão. Contudo, na visão de Fábio Gomes, “o quadro depressivo hoje já é até mais aceito, ao menos pela família e amigos”. Mas ainda de acordo com o médico, a ordem social mais ampla até então mantém certa dificuldade em entender a complexidade da depressão como uma doença que necessita de acompanhamento profissional.

Estigma

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Estigma

Causas

“A depressão não escolhe bolso ou nível social, ela pode afetar qualquer pessoa”

Por Karoline Gomes

 

A depressão não escolhe classe social, país de origem, sexo ou idade. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), uma em cada cinco pessoas poderá ter a doença em algum momento da vida. Entretanto, os jovens entre 15 e 29 anos, mulheres no pós parto e adultos acima de 60 anos são citados como os principais grupos de risco.

 

No cotidiano, experiências traumáticas podem favorecer o surgimento da doença, como a morte de alguém querido, problemas financeiros ou divórcio. A estudante Ana Júlia hoje convive com os sintomas que surgiram ainda na infância, embora não compreendesse o que era depressão aos 12 anos. Após o divórcio dos pais, apenas uma professora da escola em que estudava notou que havia algo errado. “Meus pais não perceberam, minha mãe trabalhava o dia inteiro, meu pai morava em outra casa, eu passava a manhã na escola e dormia a tarde porque não aguentava passar pelo dia”, relembra.

 

A depressão pós-parto atinge uma em cada quatro mulheres que dão a luz no Brasil, segundo a pesquisa da Escola Nacional de Saúde Pública, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). De acordo com o estudo, a média de ocorrências de depressão pós-parto no Brasil é de 26,3%. É  o caso de Joana Silveira que teve a última crise de depressão em 2014 após o nascimento da filha mais nova. No primeiro episódio, ela não precisou de tratamento com remédios, entretanto, a segunda crise teve início com o afastamento da casa dos pais seguido pela gravidez. Joana se sentia isolada e chorava sem motivo aparente, no entanto, ficou surpresa com o diagnóstico do médico ao apontar o nascimento da filha como o gatilho para o episódio depressivo, caracterizando o caso como depressão pós-parto. “Às vezes quando fico preocupada ou chateada já quero ficar deprimida. A doença é silenciosa, ela chega sem você perceber”, relata.

 

Cientificamente, a depressão pode estar relacionada com alterações químicas que geram um comprometimento biológico, quando ocorre a falta de neurotransmissores como a serotonina, noradrenalina e a dopamina nas sinapses, substâncias que transmitem impulsos nervosos entre as células. A depressão também está associada a vulnerabilidade biológica e pode ser transmitida hereditariamente, mas nem todas as pessoas com a constituição genética apresentam a doença. As mulheres têm duas vezes mais chance de apresentar episódio depressivo do que os homens por causa das alterações hormonais ao longo da vida, é o que explica Fábio Gomes, médico psiquiatra e professor da Universidade Federal do Ceará (UFC). “Usualmente a taxa de depressão é de 8% de homens deprimidos e 16% de mulheres deprimidas da população em geral, isso é uma taxa altíssima”, informa.

 

Em alguns casos, nem sempre uma situação traumática é a causa, em um dia o paciente realiza as atividades normalmente e no outro tudo começa a mudar. Foi o que aconteceu com João Ribeiro que até hoje desconhece a causa da doença. As crises de choro e os pensamentos confusos já ocorriam há anos, mas ele sequer imaginou o que estava acontecendo. Trabalhava como garçom quando começou a apresentar os primeiros sintomas da depressão. “Ficava sem ânimo, tinha momentos que eu tava bem, mas depois não tinha mais disposição, só queria tá deitado, dormindo, você se sente sem expectativa pra nada. Parece que o mundo acabou”, conta.

 

Apesar da existência dos grupos de risco, não há um perfil definitivo para o indivíduo que sofre com a depressão, como afirma o médico psiquiatra Fábio Gomes. “Depressão é muito complexo, você não pode dizer que existe só um perfil de pacientes, é uma doença polimorfia. Então, você vai ter muitos deprimidos de muitas qualidades e características diferentes, não é razoável dizer ‘o deprimido é assim’, explica.

 

Quanto mais depressa os sintomas são identificados, mais cedo o tratamento inicia

 

A OMS e a Associação Americana de Psiquiatria (APA), determinam que para ser diagnosticada com depressão, uma pessoa deve apresentar ao menos cinco sintomas do transtorno. Entre eles, um deve ser obrigatoriamente o humor deprimido, como tristeza, desânimo e pensamentos negativos, ou a perda de interesse por coisas que antes eram prazerosas ao paciente. De acordo com a Classificação Internacional de Doenças (CID), os episódios depressivos podem ser classificados em leve, moderado ou grave. O nível leve apresenta dois ou três sintomas que não interferem no desempenho das atividades, o moderado se manifesta por meio de quatro ou mais sintomas que afetam diretamente a rotina. No nível mais grave os sintomas são marcantes e angustiantes, as ideias e atos suicidas são comuns.

A depressão se apresenta em três níveis diferentes: filogenético, ontogenético e sociocultural. O nível filogenético se refere às questões biológicas, no nível ontogenético está inserida a história de vida da pessoa, os processos de aprendizagem e o modo de lidar com situações aversivas. O campo sociocultural avalia a maneira como ocorre o aprendizado do paciente, o contexto em que está inserido e as regras estabelecidas na família que podem levar ao agravamento do quadro de depressão.

 

João Ilo Coelho Barbosa, especialista em terapia comportamental e professor doutor do departamento de psicologia da Universidade Federal do Ceará (UFC), explica a importância da identificação dos níveis. “Quando você faz um tratamento, os três níveis devem ser abordados. Se ocorre a falta de serotonina nas sinapses, não existe terapia capaz de alterar esse comprometimento biológico apenas na conversa”, esclarece.

 

Os dados do departamento da OMS relacionados a saúde mental e abuso de substância psicoativa apontam que é inferior a 10% o número de pessoas que consegue perceber que estão com algum tipo de transtorno relacionado a depressão. Andrea Maluf, assessora técnica da Célula de Atenção à Saúde Mental do município de Fortaleza, reforça a necessidade de estar atento ao aparecimento dos sintomas. “A depressão não escolhe bolso ou nível social, ela pode afetar qualquer pessoa. É preciso ter um olhar mais ampliado, ainda mais dentro dessa perspectiva. Quanto mais cedo você detectar, mais cedo você previne, intervém e começa a promover a saúde”, afirma.

Causas

Consequências

“Eu cheguei a uma situação em que não conseguia fazer nada na minha vida, eu não me alimentava, não saia da cama ou ia para a faculdade”

 

Por Débora Nogueira

Isolamento social, afastamento das atividades rotineiras, demissões no trabalho, suicídios. Essas são algumas consequências da depressão, a subestimada doença que, só no ano de 2016, afastou 73 mil 273 brasileiros do local trabalho, segundo dados do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS).

 

A incapacidade de se adaptar à sociedade é o que leva pessoas com a doença a pararem atividades da vida social. A jovem Ana Júlia, que teve os primeiros sinais da doença aos doze anos, revela as dificuldades ao conviver com o transtorno. “Eu cheguei a uma situação em que não conseguia fazer nada na minha vida, eu não me alimentava, não saia da cama ou ia para a faculdade. Até hoje, tem vezes em que eu paro e penso: por que eu estou fazendo isso aqui? Porque eu estou fazendo faculdade? Eu não vejo sentido”, questiona.

 

Segundo João Ilo Coelho Barbosa, professor doutor no Departamento de Psicologia da Universidade Federal do Ceará (UFC), essa é uma reação comum em pessoas com depressão. “O principal indicativo de que a pessoa está deprimida é que ela para ou diminui atividades que costumava fazer. Ela não sai mais de casa, não faz atividades profissionais, não interage. O que acontece é uma perda de reforçadores agradáveis”, explica.

 

A falta de motivação e o medo de viver resultam em uma má qualidade de vida, problemas nos relacionamentos interpessoais, profissionais e podem interferir na saúde dos depressivos.

Além da falta de interesse em sair com os amigos, Ana Júlia teve a vida estudantil comprometida pela doença. “Eu fugia muito das aulas, eu não aguentava ficar ali, não aguentava ficar rodeada de pessoas, até hoje eu não gosto de multidões”, conta.

Sociedade em Crise

 

Muito além de um problema que afeta indivíduos, a depressão é como um problema social. O transtorno gera um impacto muito maior do que o imaginado, já que se articula com custos socioeconômicos, através de gastos com medicamentos, incapacitação profissional, internações e óbitos. Apesar das muitas razões para alguém desenvolver esse transtorno, o trabalho e sua configuração atual parecem ter grande impacto na saúde mental das pessoas.

 

Um dos principais problemas ocasionados pelo trabalho são as lesões musculares por esforço repetitivo (L.E.R. ou D.O.R.T.). As jornadas excessivas e falta de equipamentos adequados são algumas causas do crescimento dessas ocorrências, entretanto, não é apenas a saúde física que é prejudicada. Para Cássio Braz de Aquino, psicólogo e coordenador do Núcleo de Psicologia do Trabalho (NUTRA), “hoje, a segunda causa de afastamento dos bancários e dos docentes tem sido as questões psíquicas, onde a depressão e a ansiedade se destacam como os principais fatores”.

 

João Ribeiro, diagnosticado com depressão há 11 anos, acredita que um dos motivos para sua depressão foi a sobrecarga no trabalho.“Às vezes no trabalho eu já estava com o estresse muito elevado, eu sentia uma cobrança e ao mesmo tempo uma perseguição apesar de eu fazer tudo corretamente”. João trabalhava como garçom na época em que descobriu a doença.

 

A questão trabalhista vai além dos altos índices de desemprego, que atinge hoje 14 milhões de brasileiros (IBGE). A reestruturação produtiva, como é o caso da terceirização, é uma das razões que levam à essa crescente precarização e todos os males subsequentes. Para Andrea Maluf, farmacêutica e assessora técnica da Célula de Atenção à Saúde Mental de Fortaleza, as crises econômicas e os transtornos psicológicos tem uma relação direta. “Sempre a questão das grandes depressões envolviam a questão econômica. A gente viu isso na década de 1930 nos EUA e viu também um fenômeno muito grande de adoecimento psíquico”, enfatiza.

 

Apesar de não haver estimativas oficiais sobre o número de suicídios e sua relação com o trabalho, para especialistas e pesquisadores, existe sim uma relação entre eles. “Os índices de suicídios vinculados ao trabalho tem aumentado muito. Na França, a empresa Télécom teve que se pronunciar sobre o aumento de suicídios por depressão em espaços de trabalho. A gente teve casos de planos de demissão voluntária, em algumas empresas daqui mesmo, que fizeram agravar essa condição no trabalho e resultou em suicídio”, confirma o psicólogo Cássio Braz.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Suicídio, o ato final

 

“Uma coisa que a psiquiatra indicou foi que minha mãe tirasse tudo o que fosse cortante próximo a mim, materiais de limpeza, cordas. Já tive tanto pensamentos como já tentei mesmo”. Para Ana Júlia, os pensamentos suicidas eram recorrentes nas crises depressivas, “lembro que uma vez eu estava na estação de metrô e pensamentos começaram a surgir, aqueles do tipo ‘porque eu estou aqui?’. Então o metrô vinha e eu pensava: ‘será que eu poderia acabar com isso agora? Não seria melhor evitar tudo isso que está acontecendo?”.

 

No Brasil, em 2015, foram oficialmente registradas 11.178 mortes por “lesões provocadas voluntariamente”, segundo o Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS). O transtorno bipolar é hoje a maior causa desses suicídios. No entanto, o número de pessoas diagnosticadas com bipolaridade é inferior ao número de depressivos. No Brasil, a estimativa do IBGE indica que a população no período era de 204,4 milhões. Desse número, 4,2 milhões eram bipolares, segundo a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) e 11,5 milhões de pessoas tinham depressão, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).

 

Assim como em qualquer outra doença, na depressão a busca por ajuda pode salvar uma vida. “A depressão, quando é pode se manifestar com uma ideação ou até mesmo o ato [suicida]. Mas, da ideação ao ato tem uma diferença quilométrica, onde o processo de angústia vai se materializando aos poucos e se não percebido, pode evoluir até o suicídio”, explica Andrea Maluf.

 

No Ceará, cuja população estimada era de 8.904.459 habitantes em 2015, o número de suicídios registrados foi de 565. Desses, 133 foram apenas na capital. Todos esse números sinalizam o quão sério é o problema. Afinal, a depressão é uma doença que pode ser tão fatal como um câncer, como a dengue, ou diabetes. A diferença está na atenção que cada doença recebe. O suicídio pode ser evitado, mas para isso é preciso que se saiba mais sobre ele, que não haja medo em falar sobre o assunto.

 

Para Fábio Gomes de Matos, psiquiatra e coordenador do Pravida (O Projeto de Apoio à Vida), o problema está na falta de assistência. “Há uma desassistência enorme aos transtornos mentais no Brasil e isso implica que as pessoas com depressão não são adequadamente tratadas e, consequentemente, podem se suicidar”, alerta.

Consequências

Tratamentos Convencionais

“A prevenção primária é distribuir informação, tornar ela acessível às pessoas”

Por Alexandre Valério Ferreira

 

Reconhecida a necessidade de ajuda, a pessoa depressiva deve procurar ajuda profissional. De acordo com o Instituto Nacional de Doenças Mentais dos EUA (NIMH), a depressão geralmente é tratada por meio de medicação, psicoterapia, ou a combinação das duas.

 

Sobre o tratamento conjugado, um estudo publicado no periódico “Jama Psychiatry” concluiu que o método combinado é até 30% mais eficaz do que o uso isolado do remédio. O experimento foi realizado por três centros médicos universitários dos EUA. Ao todo, 452 adultos com depressão participaram da pesquisa. Entretanto, pacientes com depressão crônica não tiveram resultado mais eficaz. Para esses casos, o NIMH recomenda a Terapia de Eletroconvulsiva ou eletroconvulsoterapia (ECT).

 

O tratamento combinado engloba duas especialidades médicas: a psiquiatria e a psicologia. A neuropsicóloga Pautila Dantas explica que a psiquiatria “é voltada mais para a área da medicina. O psiquiatra trata mais da parte medicamentosa. O psicólogo trabalha com questões psicoterapêuticas. E cada psicoterapeuta segue uma corrente de trabalho”.

 

O NIMH reconhece que nunca duas pessoas são afetadas do mesmo jeito pela depressão. Em resultado, o tratamento para depressão é personalizado. O que serve para um, pode não servir para outro. O instituto também destaca que às vezes é preciso testar várias terapias até encontrar a mais adequada para o indivíduo. A seguir, apresentaremos as características dos principais tratamentos para a depressão.

 

Medicamentos

O principal grupo de medicamentos utilizado são os antidepressivos. A depressão envolve alterações na concentração cerebral de alguns neurotransmissores, como a serotonina, noradrenalina e dopamina. Os remédios agem como reguladores dessas substâncias.

 

Há diversos tipos de antidepressivos. Os mais utilizados são os inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS), tricíclicos e inibidores da monoamino oxidase (IMAO). Também pode-se receitar ansiolíticos (que diminuem a ansiedade) e antipsicóticos (para casos de agressividade e irritabilidade).

 

Quando se toma antidepressivos, é necessário ter paciência. Eles demoram de duas a quatro semana para apresentar resultado. Além disso, segundo o NIMH, sintomas como sonolência, apetite, falta de concentração e até pensamentos suicidas (para o caso de jovens até 25 anos) podem aumentar antes do medicamento começar a fazer efeito.

O médico psiquiatra e professor da Universidade Federal do Ceará, Fábio Gomes, alerta que “apesar dos efeitos positivos, remédios deveriam ser mais utilizados nos casos de depressão moderada a grave”. A Associação de Apoio aos Doentes Depressivos e Bipolares (ADEB), em Portugal, ressalta que os “antidepressivos não produzem dependência, sendo a sua ação terapêutica resultante de um reequilíbrio da perturbação depressiva”.

 

Psicoterapia

 

Segundo o NIMH, a psicoterapia pode ser uma alternativa à medicação ou utilizada em combinação com ela. Ela auxilia o paciente a ter consciência dos fatores que levaram a depressão, a reformulação de pensamentos adoecidos e a questioná-los, entendendo como eles afetam seu emocional e seu comportamento. Também pode incluir técnicas de relaxamento e treinamento para desenvolver habilidades sociais.

 

Existem diversas abordagens para a depressão. Destaca-se a Terapia Cognitivo Comportamental (TCC) e a Terapia Interpessoal (TIP). Segundo J.S. Beck, no livro “Terapia cognitiva: Teoria e prática”, a TCC “se debruça sobre o pressuposto de que o afeto e o comportamento de uma pessoa são influenciados pela maneira como ela percebe o mundo”. Já a TIP é um tratamento curto e foca na  melhora do funcionamento interpessoal.

 

Estimulação do cérebro

 

Para casos de depressão crônica ou refratária, talvez seja indicado tratamentos de estimulação do cérebro. Destaca-se a terapia eletroconvulsiva ou a eletroconvulsoterapia (ECT). A NIMH ressalta que esse tratamento não causa dor e que o paciente não sente os impulsos elétricos. Antes de cada seção, o doente toma um anestésico e faz relaxamento muscular.

 

 

 

 

O Instituto de Psiquiatria Avançada e Neuromodulação (IPAN), explica que o “ECT promove disparos rítmicos cerebrais autolimitados. Com isso, ocorre um equilíbrio nos neurotransmissores responsáveis por propagar os impulsos nervosos do cérebro e manter o bem-estar”. A sessão dura de 5 a 10 minutos.

 

CAPS

 

Estabelecidos através da portaria 3.088, de 23 de novembro de 2011, os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) é um serviço de atendimento comunitário e gratuito, que atende em todo o país. Os centros englobam medicamentação, psicoterapia, terapias ocupacionais e práticas integrativas complementares. Fazem parte de uma ação da Lei Antimanicomial (Lei Federal 10216/2001) entrou em vigor em 2001 e visa melhorar as condições de atendimento na rede pública de saúde mental.

Andrea Maluf, assessora técnica da Célula de Atenção à Saúde Mental do município de Fortaleza,  destaca que o CAPS “não tem um tratamento centrado apenas na figura do prescritor, do médico, porque isso fortaleceria a questão de medicalização. A gente tem uma equipe multidisciplinar”. Ela destaca que cada paciente é “tratado dentro do contexto” e por isso fazem um genograma, que é uma representação da história médica e psicológica de uma família, focado no indivíduo.

 

Existem CAPS para diferentes perfis de atendimento. Segundo o Ministério da Saúde, os chamados de Geral “atendem pessoas de todas as faixas etárias que apresentam prioritariamente intenso sofrimento psíquico decorrente de transtornos mentais graves e persistentes”.

 

Em Fortaleza, existem 14 CAPS. Destes, há seis do tipo geral, seis do tipo AD e dois para crianças e adolescentes. Se utilizar a fórmula para o cálculo de cobertura, disponível no Caderno de Diretrizes, Objetivos, Metas e Indicadores de 2016 fornecido Ministério da Saúde, verifica-se que a há carência de centros de apoio (fica em torno de 0,59/100 mil habitantes, enquanto o desejável é 0,70/100 mil habitantes). “A gente tem uma cobertura ineficiente. A saúde pública como um todo é deficitária”, Andrea Maluf reconhece.

 

Fábio Gomes, também coordenador do projeto PraVida (Projeto de Apoio à Vida), critica a forma pela qual os governos tratam as doenças mentais. “Trinta e duas pessoas morreram por dengue em 2016. Tem políticas públicas para combater o mosquito da dengue? Tem. Quantas morreram de suicídio na região metropolitana de Fortaleza? Trezentas. Dez vezes mais. E tem campanha prevenir suicídio? Não”, ele dispara. Vale ressaltar que a depressão é um dos fatores que mais leva alguém a tirar a própria vida.

 

Ainda de acordo com a prevenção, ele destaca que alguns pacientes não vão por conta própria em busca de tratamento, mas são levados pela família quando a situação se agrava. Daí a importância de saber identificar os sintomas do episódio depressivo e entender que ”a prevenção primária é distribuir informação, tornar ela acessível às pessoas”.

Tratamentos Conv

“O melhor tratamento é quando você agrega fármaco e psicoterapia, e, associado a isso, a mudança de estilo de vida”

 

Por Felipe Klisman

Os tratamentos convencionais são os métodos mais procurados por quem sofre com depressão. Uma alternativa para potencializar os tratamentos contra a depressão, seria complementar esses métodos com os tratamentos alternativos, que podem ser entendidos como atividades realizadas pelo paciente com o objetivo de auxiliar na melhora do quadro depressivo. O médico psiquiatra e professor da Universidade Federal do Ceará (UFC), Fábio Gomes, afirma que o convencional somado ao alternativo é algo que potencializa o tratamento da doença. “O melhor tratamento é a junção dos dois,quando você agrega fármaco e psicoterapia. E, associado a isso, a mudança de estilo de vida. Por exemplo, a pessoa não beber, dormir bem, fazer exercício já ajudam bastante. Então, mudança de estilo de vida também tem papel importante nessa recuperação da depressão”, afirma.

 

As ações complementares podem dar uma sutileza ao tratamento da depressão, mas normalmente não são utilizados. Os métodos “fogem à regra” e se apresentam como algo mais leve de ser executado, entretanto, isso não significa dizer que o indivíduo deve “abrir mão” dos medicamentos e do tratamento especializado. Em 2006, o Ministério da Saúde estabeleceu as diretrizes para Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares a serem aplicadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Entre as indicações dessa política está a de incluir a terapia comunitária integrativa no tratamento de doenças mentais fornecidas pelo SUS.

 

A terapia comunitária integrativa engloba atividades como grupos de apoio e grupos artísticos em geral. Para Andrea Maluf, assessora técnica da Célula de Atenção à Saúde Mental do município de Fortaleza, as ações complementares deveriam ganhar mais espaço dentro do tratamento da depressão. “Nós temos equipamentos que trabalham dentro das práticas integrativas complementares, e isso desconstrói um pouco esse modelo de atenção centrado na figura do médico e na figura do medicamento. E a depressão é um transtorno que deveria ser tratado muito mais pautado nessas intervenções não medicamentosas, implementando tecnologias leves no cuidado”, explica.

 

Na prática

 

Pela falta de informação, os tratamentos são pouco utilizados, mas, ainda assim, é possível encontrar pacientes que receberam orientações que vão além dos medicamentos. A dona de casa Joanna Silveira teve depressão pós-parto. Ela relata que o psicólogo dava dicas de ocupações que davam um suporte ao tratamento convencional. “O psicólogo pediu que se eu me sentisse triste mesmo após os medicamentos, não me isolasse. Me indicou ir a praia caminhar, observar o mar, conversar com amigos, e isso sempre acabava ajudando. Em outras ocasiões que eu começava a me sentir triste, já sabia como controlar’, conta.

 

Ações simples podem simbolizar grandes avanços na vida de pessoas que convivem com a depressão como é o caso da estudante Renata Nascimento que sofreu uma crise depressiva há sete anos. Na época, ela procurou ajuda especializada no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), mas os tratamentos não se restringiam somente às sessões  com os profissionais e remédios. “Lá no CAPS tinha um grupo chamando de ‘acolhimento’. Todas as pacientes eram mulheres. Antes das sessões, eram realizadas algumas atividades.Uma delas era uma roda de conversa. Todo mundo explicava o motivo de estar ali e o que estava se passando em sua vida. Eu sentia que não estava sozinha, as pessoas eram bem parecidas comigo e ali eu me sentia à vontade para dizer o que se passava comigo”, explica.

 

Renata é torcedora do Ceará e afirma que a paixão pelo time de coração, aliada aos tratamentos também auxiliaram na luta pela vida. “Melhorei muito graças ao tratamento especializado, é claro. Mas se não fossem os jogos o Ceará talvez eu não estivesse nem aqui. Fora as sessões com os psicólogos, os jogos eram os únicos momentos que eu saia do quarto pra fazer alguma coisa. Aqueles 90 minutos eram um válvula de escape”, relata.

 

Grupos de apoio

 

Maria Lúcia é coordenadora de uma das unidades do Neuróticos Anônimos, uma associação autônoma de apoio para pessoas com problemas emocionais, localizada em Fortaleza. Ela explica como é o funcionamento e como as conversas em grupo podem ajudar os pacientes. “É um grupo de estudos onde a gente trata das emoções, estudando os temas no primeiro horário e no segundo horário trabalhando com a terapia do espelho que a gente fala e o outro escuta. Através do seu companheiro que sofre com a mesma coisa, você pode se espelhar. Se ele conseguiu se curar você também é capaz. As portas estão abertas, recebemos todas as pessoas que queiram e se identifiquem com o nosso grupo”, esclarece.

 

Atividade física

 

 

O organismo só funciona adequadamente se estiver em equilíbrio de fatores físicos,  psíquicos e emocionais. A prática de exercício físico libera endorfina e aumenta os níveis de serotonina (substância responsável pelo bem-estar) e dopamina, potencializando o efeito antidepressivo do tratamento. A prática regular desses exercícios reduzem o estresse e melhoram o sono, pontos fundamentais prejudicados com a depressão. Os horários de atividades também devem ser levados em consideração já que a luz solar produz serotonina, e no escuro ocorre a queda da substância no organismo.

 

Alimentação

 

 

 

 

De acordo com o médico psiquiatra Fábio Gomes, a mudança de hábitos também contribui para combater a depressão. Assim como outras medidas complementares, a alimentação não substitui o tratamento medicamentoso e terapêutico, mas traz substâncias que são poderosos agentes na melhora do quadro depressivo.

Tratamentos Alternativos

Tratamentos Altern
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